Adiei o quanto pude essa postagem, por que acho que toco no ponto mais polêmico da legalização do enlace homoafetivo. Já falei em outros posts com todas as letras o porque de eu defender o casamento homo, e em outras oportunidades prometi falar sobre a adoção por um casal homoafetivo. Prá simplificar as coisas vou atrelar o artigo antigo ao novo e exemplificar motivos e justificativas, sempre tentando ser 100% racional. Vamos lá e o que quer que saia, será isso mesmo:
Prá tanto vou começar me justificando. Não sou homossexual, não tenho qualquer interesse em uma militância restrita e não ligo para o bem estar de determinda comunidade. Me importo com o bem estar geral, e só defendo determinada lei de proteção a uma minoria, desde que sirva para diminuir desigualdades e aplainar o relacionamento social e não gere vantagens uns tantos, que seriam negadas a outros demais. Militantes da consciência negra normalmente me dão pauladas por que discordo de cotas e da visão restrita de preconceito racista difundida na sociedade contemporânea. Militantes feministas execram minhas opiniões, e entre todas que eu conheci, apenas uma discordou de mim de forma racional, a nossa colaboradora eventual Lya, ou Lilim, ou Hiumallai, ou qualquer outro apelido pela qual a mesma se subscreva. Ela pode ser encontrada nesse mesmo blog esporadicamente nos brindando com textos ou notícias. Discordamos, mas nos respeitamos muito, que fique claro.
A verdade é que a única militância de minorias que de certa forma tem algum "carinho" por mim, é o orgulho gay, por que nunca me apontaram algo absurdo pleiteado pelos mesmos(bom, quase tudo, só acho chato quando esperneiam quando falo de Marcha do Orgulho Hétero, mas não é o caso discutido no artigo.)
Agora melhor deixar de rodeios antes que se cansem:
Gays, pleiteiam algo que considero muito significativo para sua própria dignidade.
1) Reconhecimento da união civil entre pessoas do mesmo sexo.2) Legalização da adoção por casais homoafetivos.
Bastante razoável. Isso não gera o menor problema pra mim enquanto cidadão, e é um direito que minha noiva e eu temos. Se assim o desejármos, o teremos. Mas por que acho isso?
Pois bem, se casado, posso contar com uma partilha de bens justa entre mim e minha esposa, caso decidamos desfazer o contrato de matrimônio. gays não. Se separam e perdem anos em brigas pelos bens que conquistaram enquanto unidos.
Se casado, e eu morrer, minha esposa e meu rebento herdarão meu patrimônio, que atualmente não passa de um amontoado de dívidas. Gays não. Para ilustrar vou mencionar um exemplo que não é regra, mas não é nada incomum. Imagine por exemplo um rapaz, criado por uma família conservadora, num belo dia aparece em casa e revela: "Pai, mãe, estou namorando com o Maurício e vou morar com ele". É no mínimo proposto para que ele entre em terapia, e caso conte com pais irascíveis, expulso do seio familiar da qual ele tinha proposto de deixar amigavelmente. Ele e seu amado conquistam alguns bens. Um pequeno apartamento, um carro popular, uma pequena poupança. Enfim, uma vida simples mas confortável. Nosso incauto anti-herói falece. Como fica a herança? Pai e mãe teriam a ombridade de recusar os bens que foram conquistados unicamente com o suor do casal? Creio que não. Pega-se o carro popular, coloca um desinfetante bacana, para se livrar do cheiro de sexo subversívo no banco traseiro, joga-se algumas traquitanas afeminadas fora, e tá pronto pra virar um carro "macho". A casa pode ser vendida e virar uma bela poupança. A poupança usurpada para tornar esse um valor um pouco mais robusto. Enfim, morto, o guri é considerado útil pela família, mas não passava de um desgosto enquanto partilhava teto com outro homem. O parceiro, que conquistou os bens junto do namorado, recebe um "CHUUUUPA, MAURÍCIO!!!" e caso não perca tudo, perde ao menos parte do investimento financeiro do relacionamento.
Nesse segundo caso, um amigo meu, advogado mencionou a mim uma dica interessante. De que numa batalha judicial pelos bens, ele não entraria no escopo da vara de família, usaria direito societário para defender os bens do cônjuge sobrevivente. Bela dica, vale muito a pena ter em mente. Mas por que eles tem que entrar numa batalha judicial se eu não tenho? E visualizando um cenário mais pessimista, e se o juíz que avaliar o caso, for religioso praticante? Seria o juíz imparcial? Tenho sérias dúvidas.
Quanto ao que é mais importante a esse artigo, a adoção por casais homoafetivos:
Agora o couro come e muita gente vai me xingar. Vou começar entrando de sola. Gays podem, sim, adotar crianças. Vamos aos porquês.
À luz da psicologia moderna, não existe indicativo de que a orientação sexual dos pais de fato seja fator decisivo nas preferências afetivas da progêne. Esse é o argumento mais utilizado. É um caso bastante comum, todo mundo conhece alguém que veio de uma família média bastante comum, com todos os clichês possíveis de família bacana e ortodoxa, que no fim das contas tem um filho desmunhecado. Se esse argumento fosse de fato válido, gays seriam aberrações na escala evolutiva. Acha gays aberrações? Então se ter pais héteros não é garantia de ser hétero, por que ter pais homo é garantia de ser homo? Na psicanálise, Freud defende que crianças se tornam homossexuais quando os conceitos de figura masculina ou feminina são de alguma forma invadidos ou deturpados. Acho que faz sentido. Mas essas figuras não são necessariamente pai e mãe. O objeto de admiração, modelo de uma criança, pode ser um amigo mais velho, irmão, professor, personalidade e etc. Coisa absolutamente comum em crianças sustentadas por chefe de família (pai ou mãe) solteiros.
Mas supondo-se que seja de fato um fator importante, coisa que também não sou estúpido de negar. A criança deve ser educada de forma a ser honesta, pagadora de impostos, e atingir maturidade psicológica, afetiva e educacional. Se a maturidade afetiva é atingida ao se sentir atraída por alguém do mesmo sexo, tanto faz. Vai dizer o que? Ser gay é errado? Não? Então por que se preocupar se o infante é educado segundo princípios gays? Faz tudo parte do NOSSO CONCEITO sobre certo e errado, e não de uma verdade pétrea. Educação impingida por uma sociedade patriarcal (ia falar aqui do meu opressor falocêntrico, mas deixa pra lá.). Uma resposta racional pro questionamento e ganha um doce.
Agora em aspectos puramente jurídicos, e cabe mencionar que não sou advogado, vou mencionar outro exemplo para defender a adoção homoafetiva.
Suponha um cenário onde, por exemplo, Marcela e Regina são namoradas. Marcela quer ter um filho, mas não quer se submeter ao esperma de ninguém, o que é uma pena, convenhamos, por que ela é muito da gostosa e eu me prontificaria qualquer hora. O casamento gay não é aceito juridicamente, então Marcela decide adotar uma criança como mulher solteira, coisa legalizada, e aos poucos se tornando comum. Junto com o rebento, acolhe Regina em seu pequeno apartamento de dois quartos. Assistentes sociais fazem uma visita e entendem que a nova mãe tem condições psicológicas e financeiras de educar a criança. As meninas educam o guri enquanto vivas, formam um patrimônio segundo o exemplo anterior, e pum, Marcela bate o picau. Só para lembrar, Marcela fora educada segundo os padrões da família anterior, de maneira áspera e conservadora. Agora falecida, a família quer sua parte do bolo. Melhor, o bolo todo ficaria de bom tamanho. Voltamos mais uma vez à batalha judicial. Já que o casamento não é reconhecido, vira alvo de batalha jurídica a divisão dos bens com Regina. A guarda da criança provavelmente vão para os avós, que em hipótese são o parente mais próximo, visto que Regina não é reconhecida como mãe do guri. Já que estamos falando de um menor, eles também assumem a tutela sobre a herança dele. O que sobra a Regina? Regina formou o patrimônio com Marcela, com ajuda de mais ninguém. Regina educou a criança, os avós não. No fim das contas, Regina é forçada a enfiar o rabinho entre as pernas e voltar a pagar aluguél, ou calçar a cara e pedir moradia aos pais, além de perder o direito à convivência com o moleque que ajudou a educar. Bastante justo, não acha?
Só pra finalizar. Que país que quer integrar o time dos países de primeiro mundo, e tem uma visão tão arcaica dos modelos de família? Eu sei que mesmo grandes potências tem problemas em acatar a questão, mas quem quer ser um visionário de vanguarda, e garantir ao seu povo o tratamento o mais eqüitativo possível, deve agir como visionário de vanguarda.
Maldito mundo hipócrita. Todos somos. Eu, você e nossos semelhantes.
[Autorizo cópia total e irrestrita do artigo, desde que mencionados Autor e Fonte].
3 comentários
Eu acho muito cansativo ler essas letrinhas tão pequenas, ainda mais com texto claro sob fundo escuro.
Atendendo a seu pedido, alterei o tamanho da fonte, Arthur, entre outras mudanças sutis. Aos poucos mudo o template. Agora espero que leia. Parte do texto, inclusive, foi inspirada em nossa conversa sobre o assunto.
Melhorou. Claro que minha bronca com letras claras sobre fundo escuro continuará por toda a eternidade, mas agora está bem mais legível. :-)
E eu já havia lido, apesar da dificuldade. Hehehehe...
Não dá mesmo pra entender por que raios - a não ser bitolação religiosa de quinta categoria - alguém haveria de ser contra garantir a segurança jurídica do menor adotado, porque é só isso que está em jogo na adoção por casais homossexuais.
A adoção por homossexuais em si já é fato há muito tempo. Casos de casais homossexuais que adotaram crianças em nome de apenas um dos integrantes do casal abundam. Ou seja, as crianças já estão sendo adotadas e criadas por gays e lésbicas, só não têm a segurança jurídica necessária para não ter sua vida virada pelo avesso caso venha a falecer justamente aquele em nome de quem foi feita a adoção. Ou no caso de separação - porque aí gays e lésbicas são tão cruéis quanto os heterossexuais na hora de fazer valer seus interesses aproveitando-se da condição de adotante legal.
Quem se posiciona contra a adoção por casais homossexuais está dizendo para as crianças adotadas: "eu não me preocupo com o bem estar de vocês, vocês são apenas os peões em meu jogo de imposições arbitrárias devidas a fanatismo religioso".
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